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Mortal Kombat - Agrotóxicos.

Agrotóxicos, ou defensivos agrícolas, são produtos comumente utilizados no combate às pragas em plantações, sendo associados tanto a benefícios, em termos de produtividade de alimentos, como a riscos à saúde humana e ambiental. No decorrer dos últimos anos, vimos algumas notícias sobre a aprovação de mais dessas substâncias no Brasil, por exemplo, e a proibição de várias destas em outros países. Mas de fato, quais os riscos potenciais dos agrotóxicos? Existem alternativas sustentáveis ao uso destas substâncias? Vamos dar um pequeno mergulho e tentar esclarecer o que são tais substâncias e como podem nos afetar.


Letícia Sayuri, Cyntia Almeida, Guilherme Caitano e Gildo Girotto Júnior.


Agrotóxicos? O que são? Onde estão?


Desde 2008 o Brasil é um dos países que mais consome agrotóxicos devido ao desenvolvimento do agronegócio no setor econômico. O que também impressiona é que as empresas que produzem alguns tipos de agrotóxicos estão sediadas em países onde estas mesmas substâncias são proibidas, por exemplo, Syngenta, Bayer CropScience e BASF. Trágico se não fosse cômico, uma vez que boa parte dos alimentos produzidos aqui são exportados.

Em 2021, inúmeros jornais anunciavam o novo recorde histórico do Brasil, ao encerrar o ano com o total de 562 agrotóxicos aprovados para uso. A quantidade de produtos autorizados vem aumentando gradativamente desde 2016, tendo um crescimento significativo em 2017, ano no qual 127 pesticidas foram aprovados. Mas o que são esses produtos e como eles afetam a saúde da população?

Segundo o INCA (Instituto Nacional de Câncer), que possui ligação com o Ministério da Saúde, os agrotóxicos são materiais sintéticos, ou seja, produtos elaborados laboratorialmente, usados no combate a insetos, fungos e doenças que podem afetar as plantações, além de auxiliar no crescimento da vegetação. Há um grande interesse no uso dessas substâncias, já que quanto menor a perda na plantação, maior a produtividade (quantidade produzida) e, consequentemente, maior o lucro na venda desses produtos. Há, também, a questão sanitária, uma vez que verminoses (como a cisticercose, amarelão, dentre outras) são frequentemente passadas por meio do contato com terra, água ou alimentos contaminados.

Contudo, essa estratégia para proteger a produção e a lucratividade tem sido considerada uma ameaça à saúde humana em virtude do próprio consumo dos alimentos que chegam à mesa, bem como pela manipulação e aplicação de tais substâncias no decurso do cultivo. Dentre os diretamente afetados, podemos considerar os agricultores e os agentes de controle e trabalhadores de indústrias que desenvolvem os agrotóxicos. Indiretamente, todo o público consumidor pode ser alvo do contato com os produtos que se acumulam nos alimentos. Ainda, o uso de agrotóxicos pode gerar contaminação ao solo e, consequentemente, as águas próximas a essas plantações.

Tal fato acaba por tornar-se preocupante pois, segundo a OIT (Organização Internacional do Trabalho), agentes contidos nos agrotóxicos podem gerar alterações metabólicas e hormonais no ser humano, principalmente em mulheres grávidas, pois pode afetar o desenvolvimento do feto. Esses efeitos contra a saúde são decorrentes, no geral, do uso crônico/prolongado dessas substâncias e incluem, dentre outros, alergias, alterações nos sistemas gastrointestinal, respiratório, circulatório, endócrino, reprodutivo, na pele, bem como podem ser provocadores diretos de alguns tipos de câncer. Dados indicam que os países em desenvolvimento enfrentam anualmente cerca de 70 mil intoxicações agudas e crônicas, e mais de 7 milhões de casos moderados a leves.

Mas é tudo igual?


O termo agrotóxico tem alguns sinônimos. Cabe destacar que, por ter o termo "tóxico" no nome, há inclusive tentativas de mudar a nomenclatura na busca de amenizar sua característica prejudicial. Dentre os diferentes termos, podemos citar: pesticidas, praguicidas, remédio para plantas, inseticida, fungicida e defensivos agrícolas. Você consegue perceber que a terminologia busca utilizar estruturas que sejam ofensivas contra as pragas e não contra o ser humano ou ao meio ambiente. No entanto, vale destacar que nesse conjunto, cada um desses produtos apresenta uma determinada função, uma certa espécie de combate. Temos até os que combatem aves, mas todos eles possuem algo em comum: se encaixam na Lei Federal nº 7.802, de 11 de julho de 1989, regulamentado pelo Decreto nº 4.074 de janeiro de 2002, onde temos que agrotóxicos são produtos e agentes de processos físicos, químicos ou biológicos destinados ao setor agrícola, pastagem, florestas nativas ou plantadas, e outros ecossistemas, com a finalidade de alterar a composição da flora e da fauna, em busca da preservação contra a ação de seres vivos considerados nocivos.

Mas fica o questionamento: Como funciona a escolha de cada um dos métodos? Qual a diferença entre os tipos de controle?

Os métodos são escolhidos de acordo com a eficácia em relação à determinada praga, questões econômicas e em relação ao efeito ecotoxicológico, ou seja, relacionados ao impacto no ambiente e na saúde humana. A diferenciação dos controles ocorre pelos meios que são usados e podemos ter: o biológico, que usa "inimigos" naturais, podendo ser outros insetos, fungos e até mesmo microorganismos (vírus, bactérias e bactérias), como especifica a Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária); o químico, que apresenta a aplicação de substâncias que causam a morte da praga; o físico, que consiste na drenagem, inundação, fogo, aumento da temperatura ou radiação eletromagnética.

Além dessas distinções, outro fator a ser considerado é a toxicologia do método, que consiste nos efeitos nocivos que podem originar-se a partir da implementação de um produto ou método. Os níveis toxicológicos são subdivididos em quatro estágios de periculosidade, sendo identificados por meio de colorações, como mostra a imagem 1.


Imagem 1 - Tabela de toxicidade (fonte: INCA, 2021).


Um dos exemplos de inseticida mais conhecidos é o DDT, que hoje é banido do mercado. Sua toxicidade se dá por conta das moléculas que o constituem serem muito grandes e pouco solúveis em água, o que faz com que interajam com a gordura dos tecidos dos seres que a ingerem. Então, a ingestão desses pesticidas diariamente, de pouco em pouco, pode gerar sua acumulação no organismo, gerando doenças como determinados tipos de câncer ou relacionadas à variações hormonais.


A única alternativa?


O grande uso de agrotóxicos faz parecer que eles são o único meio de se evitar pragas na plantação, o que não é verdade. Pequenas propriedades de agricultura familiar são conhecidas por serem produtoras de alimentos orgânicos. Esses alimentos são livres de agrotóxicos e, nessas produções, a matéria orgânica é sempre reutilizada, gerando uma adubação natural. O controle de pragas, no entanto, acaba por ser um desafio, sendo necessárias barreiras físicas, predadores naturais (que também não prejudiquem a cadeia alimentar da região) e plantas que sejam mais atrativas do que o produto desejado.

Além disso, o debate sobre a lucratividade de grandes lavouras com e sem o uso de agrotóxicos e outras questões sobre a quantidade a ser produzida entra em questão, não sendo tão evidentes os dados daqueles que são partidários do uso dos agrotóxicos. A impressão que fica é de que não se procura uma mudança na política de adoção dos agrotóxicos pois o processo já está bem estabelecido e uma mudança no cenário poderia gerar "trabalho extra" e perda de rendimentos. Portanto, ainda que possam gerar prejuízos, opta-se por manter o sistema.

Um conhecido produtor de alimentos orgânicos é o Movimento Sem Terra (MST), que conta com diversos acampamentos espalhados pelo país, nos quais há a plantação por meio de técnicas não prejudiciais ao meio ambiente e aos trabalhadores desses lugares.

Além dessa opção, a Embrapa, com o intuito de se alinhar aos Objetivos Sustentáveis da ONU para 2030, tem desenvolvido pesquisas sobre insumos biológicos, que são enzimas, extratos (de plantas ou microrganismos), microrganismos e macrorganismos. Esses métodos podem ser utilizados tanto para combate de pragas quanto para nutrir a plantação.

Assim, há um conjunto de estudos e pesquisas que vêm sendo realizadas como forma de buscar uma alternativa aos agrotóxicos quando falamos de controle e combate de pragas. É também evidenciado pela proibição de várias das substâncias em outros países, que a liberação em massa do uso de algumas destas substâncias não se faz necessária. O investimento na pesquisa de outros métodos (insumos biológicos, por exemplo) pode trazer resultados que permitam uma reestruturação na produção. No entanto, é preciso que a pesquisa seja reconhecida como uma forma de mudança na cultura de produção de alimentos.


Referências

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ALMEIDA, W. FIÚZA, J. MAGALHÃES, C. JUNGER, C. Agrotóxicos. Caderno de Saúde Pública. v. 1 (2). 1985. Disponível em : <https://www.scielo.br/j/csp/a/fqHFphQtcS6JYcNmjYjhvzq/?lang=pt>

PERES, F. MOREIRA, J. DUBOIS, G. Agrotóxico, saúde e ambiente: uma introdução ao tema. FIOCRUZ. p. 21-41. 2003. Disponível em: <cap_01_veneno_ou_remedio.pdf (fiocruz.br)>

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PICANÇO, M. Manejo integrado de pragas. Departamento de Biologia animal. Universidade Federal de Viçosa. 2010. Disponível em: <https://www.ica.ufmg.br/wp-content/uploads/2017/06/apostila_entomologia_2010.pdf>

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SALATI, P. Após novo recorde, Brasil encerra 2021 com 562 agrotóxicos liberados, sendo 33 inéditos. G1. 2022. Disponível em: <https://g1.globo.com/economia/agronegocios/noticia/2022/01/18/apos-novo-recorde-brasil-encerra-2021-com-562-agrotoxicos-liberados-sendo-33-ineditos.ghtml>


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